Apesar das recentes modificações na legislação tributária pátria decorrentes da crise mais intensa dos últimos anos, um ponto importante ainda encontra-se sem solução quanto à não cumulatividade das contribuições ao Programa de Integração Social (“PIS”) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (“COFINS”), sendo de grande importância o enfrentamento da questão para a definição do tratamento tributário dos descontos comerciais ou bonificações em face do disposto nas Leis nº 10.637/02 e nº 10.833/03.
No que concerne às bonificações e descontos comerciais, trata-se normalmente da concessão comercial realizada pelo vendedor ao comprador, ocasionando na diminuição do preço do bem ou na entrega de quantidade maior que a estipulada, sendo certo que, nos casos dos grandes varejos, geralmente estão vinculadas ao desempenho de vendas, veiculação de propaganda, estratégias promocionais (alteração do preço de mercado/liquidação/”encontrão”), “price/rebate”, exposição de mercadorias, dentre outros.
Com o objetivo de sistematizar as divergências com relação a esse tema, é importante identificar as principais linhas interpretativas existentes, pois as autoridades administrativas já se pronunciaram no sentido de que os valores referentes às bonificações e descontos comerciais seriam excluídos da receita bruta para fins de determinação da base de cálculo do PIS e da COFINS, somente quando se caracterizarem como descontos incondicionais concedidos, sendo estes aquelas parcelas redutoras do preço de vendas constantes da nota fiscal de venda dos bens ou da fatura de serviços e não vinculados à evento posterior à emissão desses documentos.
No entanto, a doutrina e a jurisprudência do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”) vêm divergindo com relação a esse tema, pois alguns doutrinadores (seguidos por parte dos julgadores administrativos) entendem que esses valores a título de bonificações e descontos comerciais seriam apenas reduções do preço de aquisição (redutores de custo) quando da compra de determinado produto por parte da empresa, que revenderá o mesmo, independentemente de ser condicional ou incondicional.
Uma outra parte entende que na medida em que esses valores estiverem desvinculados das operações de venda e que as bonificações e descontos comerciais são transferidos por mera liberalidade da empresa, não existiria o auferimento de receita nessa operação em face da sua natureza de doação.
No entanto, outra linha interpretativa é encontrada no caso de um grande varejista julgado no final de 2014, no sentido de que as bonificações e descontos comerciais não se incluiriam no rol de exclusões descrito na legislação, pois os fornecedores contribuiriam financeiramente com os varejistas em face do seu interesse em obter alguma contrapartida, o que se afastaria dos conceitos de desconto incondicional e de receita financeira.
Após muita discussão, ao buscar pacificar o entendimento sobre a matéria, a 3ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (“CSRF” – acórdão disponibilizado em 04/04/16), órgão máximo do tribunal administrativo federal, entendeu que os descontos obtidos perante os fornecedores a título de distribuição de mercadorias, atividades de propaganda, aniversário, inauguração, reforma e reinauguração de lojas, fidelização e bonificações, deveriam ser considerados como receita para fins de incidência das referidas contribuições.
Depois, ao se posicionar novamente sobre a matéria através do acórdão nº 9303-003.515 (acórdão disponibilizado em 10/08/16), a 3ª Turma da CSRF fixou o entendimento de que as obrigações com propaganda, exposição em espaço com maior visibilidade, atividades de promoção, dentre outros, não poderia ser caracterizada como desconto, mas sim como um serviço prestado pelo comerciante ao fornecedor, o que culmina no dever de inclusão na base de cálculo do PIS e da COFINS.
Além disso, quanto às mercadorias entregues sem vinculação à operação de compra e venda, os julgadores entenderam que na medida em que o vendedor estaria entregando algo maior do que o combinado/obrigado, tal medida se afastaria do conceito de bonificação e se aproximaria da natureza jurídica de doação. Nesse sentido, prevaleceu o entendimento do Conselheiro Júlio César Alves Ramos no sentido de que os valores referentes a essas mercadorias recebidas deveriam ser consideradas como receitas pelos varejistas para fins de tributação do PIS e da COFINS, em face do aumento de seu patrimônio líquido.
Vale ressaltar que o nosso sócio da área tributária Allan Fallet, teve seu artigo publicado à época sobre A incidência do PIS/COFINS sobre bonificações e descontos comerciais (https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/incidencia-piscofins-sobre-bonificacoes-e-descontos-comerciais-06092016).
Agora, em recente julgamento pela 3ª Turma da CSRF, o Conselho deu provimento ao recurso do contribuinte Bompreço Supermercados do Nordeste, afastando a incidência do PIS e da COFINS sobre descontos obtidos na aquisição de mercadorias (10480.722794/2015-59).
Nesse caso, prevaleceu o entendimento de que descontos incondicionais e bonificações não teriam natureza de receita, não incidindo, portanto, as contribuições (voto de qualidade).
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em recente e raríssima decisão, se manifestou de forma favorável sobre o tema no caso do contribuinte WS Supermercados do Brasil ao entender que os descontos e as bonificações em mercadorias obtidas pelo comprador não constituiriam receitas passíveis de incidência das contribuições ao PIS à COFINS, posto que as contribuições devem recair sobre as receitas incorporadas ao patrimônio do contribuinte com as vendas das mercadorias e não sobre a receita dele desincorporadas para cumprir a obrigação contratual da compra da mercadoria (5052835-04.2019.4.04.7100/RS).
Para quaisquer esclarecimentos, por favor, entrem em contato com Allan Fallet (allanfallet@maugermuniz.com) por e-mail ou pelo telefone (11) 3755-0808.